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sábado, 11 de outubro de 2014

Sotaques do Brasil



Eu Pum.


Nos anos 80 fiz uma longa e cansativa viagem para o norte do Brasil.


Fui para a cidade de Dianópolis na época no Estado de Goiás, hoje Tocantins, lembrando que o Estado de Tocantins foi criado por uma Constituição, a de 1988, que desmembrou o grande e comprido Estado de Goiás, onde, de sua parte norte surgiu então essa maravilhosa e próspera Unidade da Federação.

                                Brasília - DF

Após cansativa viagem, até Brasília, me aventurei em um ônibus por estradas de terras até chegar a Mimoso do Oeste, hoje denominada Luís Eduardo Magalhães, numa viagem que durou a noite inteira, chegando lá por volta das 4,30 horas da matina.

                                Mimoso - hoje, graças a Gauchada que foi plantar soja por lá.
                             

Ali o ônibus seguiria para o leste, indo para a cidade de Barreiras, portanto para mim era o fim da linha. No próprio ponto de parado do ônibus, havia um restaurante e um posto de gasolina.


Mimoso era uma pequena vila no meio do nada. Um quase nada no meio do nada. Meia dúzia de casas.

                                Dianopolis - TO


Procurei então saber se havia algum transporte que me levasse até Dianópolis, porém fui informado que com muita sorte poderia arrumar uma carona, pois não havia nenhum tipo de transporte oficial para aquelas canhadas.


Aconselharam-me a aguardar em uma bifurcação perto do Posto de Gasolina, pois geralmente alguém, sabendo da impossibilidade de transporte desse uma carona.


Eram outros tempos e isso era normal e possível, o que hoje e temerário e quase impossível.


Lá pelas tanta um senhor que também iria para Dianópolis se aproximou, era madrugada e o mesmo dando um bom dia ficou ali dizendo que também estava jogando com a sorte.


Mais algum tempo saiu do Posto de Gasolina um Onze-Onze Baú azul que já veio meio parando, pois fora avisado no posto que havia duas pessoas aguardando uma carona.

                                             1111-MB

Onze-Onze (1111) é um modelo de caminhão da Mercedes Benz, o famoso MB 1111.


Vinha esse caminhão com o seu motorista, obviamente e um ajudante, e aperta daqui, aperta de lá fomos os quatro mais apertados que sardinha enlatada.

                                Dianópolis - TO

Depois de muita estrada de terra, sede, cansaço e dores pelo corpo, chegamos finalmente a cidade de Dianópolis, e tão logo o caminhão passou a ponte no início da cidade pedi ao motorista que parasse em frente ao Hotel Atalaia, e ali fiquei.


Era um hotelzinho simples, todo branco, mas que daria bem para descansar. Um bom banho para aliviar o cansaço e tirar a poeira foi imediato e logo após almocei no próprio Hotel.


Cansado e doído fui direto para a cama, porém não consegui dormir, pois chegou a minha procura a pessoa que me levaria para conhecer duas fazendas da família e que estava nos planos de eu ir para lá tomar conta das mesmas.

Tudo bem, isto é página virada. Vamos de vereda ao hilário.

Naquela noite, após mais um dia cansativo dormi ferradíssimo sendo acordado com estranhos sons que vinham de "mui lejo".


Afinei os ouvidos, o dia começava a clarear e aqueles gritos vinham de muito longe. Mal dava para entender.


Continuei por um tempo deitado tentando entender o que gritava. E aos poucos comecei e ouvir mais claro o que, pela voz era  menino.


E Gritava:


Eu pum!
Eu pum!


Conforme um se aproximava mais claro ficava o som:


Eu pum!

Eu pum!


Levantei-me, coloquei uma calça, e como estava bem fresquinho, coloquei também uma campeira de brim cinza, passei rapidamente uma água no rosto, escovei-me e saí pela lateral do hotel, era um terreno ao lado que servia de estacionamento para os raros automóveis, e fui até a frente do Hotel.


Os gritos continuavam, só que agora mais altos:


Eu pum!
Eu pum!


Notei também que não era apenas um menino que gritava, pois em outros sentidos da pequena cidade outros também gritavam, e era aquela profusão de:


Eu pum!

Eu pum!


E quanto mais se aproximavam mais alto ficava:


Eu pum!

Eu pum!

Lá pelas tantas avistei na quadra acima, um menino descendo rapidamente, com um balaio ao braço, coberto com um pano branco gritando:

Eu pum!

Eu pum!


Quando o menino ia passando do outro lado da rua chamei-o para saber o que era, e o menino atendendo o meu chamado se aproximou enquanto gritava:


Eu pum!

Eu pum!


- Bom dia "piá", "me" digas o que "tu " levas aí "neste" balaio.


O piá levou um simbronaço quando ouviu meu sotaque, e mais desconfiado do que cavalo aporreado me respondeu:


Eu pum!


- Deixe-me ver. - Disse então.


Ai o menino levantou o pano branco e eu pude ver o que o guri vendia naquela, ainda madrugada.


Pão!

                                 Eu pum!

Porém em vez de gritarem “é o pão” eles gritavam “eu pum”.


Êta Brazilzão e seus sotaques...




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