Em 1974, ninguém tinha
liberdade de ir e vir, muito menos de falar ou pensar.
Eram tempos de ditadura, que
muito bobalhão vive a pedir o retorno de tempos de chumbo. Se o idiota quer uma
ditadura, já escrevi e repito, vá para a Coréia e pronto. Ficarás como queres e
nós nos livramos de um bobalhão.
Bueno. Como ia dizendo eram
tempos duros, ditadura, falta de liberdade, torturas, assassinatos e prisões
arbitrárias.
Em uma tarde canicular, aonde
as temperatura em Porto Alegre chegavam a quase quarenta graus uma viatura da
Polícia Civil estacionou na Rua Voluntários da Pátria, quase na esquina da Rua Vigário José Inácio, no centro, para dar
apenas um susto nas prostitutas que faziam ponto naquela via, e ali permaneceu
ao sol por mais de uma hora.
Os dois policiais estavam dentro de uma galeria aproveitando o frescor da sobra, enquanto mais e mais quente ficava o camburão, momento em que para
mostrarem serviço foram identificar um cidadão e este estava sem seus documentos.
Autoritariamente os
policiais o colocaram no camburão e foram para um bar tomar algo gelado, talvez uma cerveja.
Passado quase uma hora o
cidadão preso cozinhava dentro da viatura e começou a gritar por socorro.
Os dois policiais não deram
as mínimas, e por desdém afastaram-se da viatura mais de trinta metros, indo em direção da Rua Marechal Floriano deixando
o infeliz cozinhando ali dentro.
Um jovem funcionário da
extinta e histórica Ferragem H. Theo Möller, do Grupo J. H. Santos, saiu da loja em que
trabalhava, foi até a Galeria ao lado onde havia um telefone público e
fez uma ligação para o Quartel General do antigo 3º Exército.
A ser atendido, pediu para falar urgente com o Oficial-de-Dia e sem se identificar
relatou que dois policiais civis haviam prendido um soldado do Exército, e que
este estava trancado dentro de uma viatura ao sol, gritando, pois estava sendo
cozido dento da viatura.
Não demorou dez minutos ao
local chegaram duas viaturas da P.E., Polícia do Exército, talvez vinda do próprio QG, já que neste época havia sido transferida do quartel que tinha em frente à Praça do Portão, onde se lia em seu frontispício "Si Vis Pacem, Para Bellum", para o Morro Santa Teresa e imediatamente os
militares cercaram o camburão todos munidos de enormes cassetetes e pistolas.
Os dois policiais civis de longe ao
verem aquele movimento de homens do Exército em seus uniformes tradicionais, capacetes e braçadeiras da P.E. e temendo alguma coisa se acoitaram dentro de uma loja, perto da Rua Marechal Floriano, quase sem respirar, e ali ficaram observando, assustados.
O pobre homem continuava a
gritar dentro da viatura, que além dos militares do Exército estava cercada por
dezenas de cidadãos curiosos e como os militares do Exército não encontraram os
responsáveis pelo caminhonete da Polícia Civil e pensando que realmente fosse um soldado do Exército que estava detido, já que aqueles camburões eram totalmente fechados de puro aço e quase sem ventilação, não tiveram dúvidas e seu comandante mandou que arrombassem a porta.
Munido de um machado, um enorme Cabo
da PE destruiu o cadeado da porta, danificando também a própria porta da
viatura e ao depararem com o pobre homem molhado de tanto suar viram que não se
tratava de um militar, então o liberaram.
Os dois policiais civis sem saber o que fazer e tendo que arcar, talvez com o conserto da viatura, ficaram com cara de otários e continuaram escondidos como guris cagões
dentro daquela loja até que a P.E. fosse embora.
Orre Tasca!
Bem bolado o estratagema desse funcionário da Ferragem H.Theo Möller. Merecia uma medalha.
Explicações:
1 - Vocês notaram que por
duas vezes escrevi sol com “s” minúsculo. Assim escrevi, pois estou me
referindo à luz do Sol, porém quando nos referimos a estrela que leva esse nome devemos escrever
com “S” maiúsculo, pois é o seu nome próprio.
2 – Quando em 1973 casei com
Sandra, ela trabalhava como Secretária desta Ferragem H. Theo. Möller, onde
permaneceu até o ano de 1975, saindo desta empresa meses antes de irmos morar
no Mato Grasso, na região que hoje é o Mato Grosso do Sul.
3 - Si Vis Pacem, Para Bellum, é um provérbio latino da época dos Césares que quer dizer "Se queres a Paz, Prepara-te para a Guerra"
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