Inicio dos anos 80 ia eu
tranquilamente pela Rua Voluntários da Pátria, no centro de Porto Alegre, entre
as Ruas Vigário José Inácio e Doutor Flores, ainda cedo, sete e pouco da manhã,
quando em sentido contrário vinha um, na época jovem homem negro, com sua
bengala tateando a calçada.
Já o conhecia, era um pobre
homem cego que seguidamente, há muitos anos o via no centro da Capital.
Ele havia nascido cego e sem
perspectiva vivia da caridade de um ou outro.
Quando o mesmo aproximava-se
dei-lhe passagem entrando em uma porta recuada de uma loja, e ali fiquei a
observá-lo em seu passo incerto.
Ao passar por mim uns dois
ou três metros esbarrou em uma mulher que estava olhando a vitrine da loja.
Esta ao sentir-se encostada
por um homem negro, estúpida e raivosamente, sem perceber que se tratava deficiente
visual, desferiu um violento tapa em seu rosto.
Ao ser agredido, não sei
como, ele conseguiu em um movimento rápido pegar a mulher pelo pescoço e com
violência bateu duas ou três vezes com a cabeça dela na parede da loja.
Atônito fiquei a observar a
agilidade do pobre homem cego, que em sofrer uma desmerecida agressão soube se
defender.
Entretanto vi dois homens
correrem na sua direção e enquanto o mais velho segurava o rapaz pelo braço direito
o outo desferiu um forte soco, que o atingiu do lado do rosto.
O Povo que passava ao ver a
briga afastou-se momento em que eu tinha que de alguma forma agir para evitar o
espancamento do pobre homem cego.
Num pulo e aos gritos
empurrei o homem mais velho, que desequilibrou e caiu na calçada, enquanto que
o mais novo fez menção de me atingir, mesmo eu gritando que se tratava de um
homem cego.
Na verdade os dois homens
estavam “cegos” de raiva do cego.
Quando o homem mais jovem
desferiu um soco em minha direção, defendi-me com o braço esquerdo,
surpreendendo-o com um movimento rápido imobilizando contra a parede.
Aos gritos dizia a ele que o homem negro era cego, momento em que o empurrei para o lado e abracei o
cego protegendo com o meu corpo.
Os outros dois, aturdidos,
pararam e somente aí entenderam o que eu dizia.
A mulher continuava estatelada
ao chão com as pernas esticadas e as costas encostadas na parede.
Dois populares se acercaram
para prestar-me auxilio momento em que dialoguei com os três agressores. O
marido, a mulher e o pai dela.
Depois de uma conversa
rápida e ríspida, cercados de populares, os dois mais desconfiados que gato em
casa nova foram pedir desculpas ao cego.
Foram-se para o lado da
Praça Rui Barbosa e eu mudei meu trajeto e levei o homem cego até as esquina da
Avenida Borges de Medeiros com a Rua José Montauri.
Há pessoas que já saem de
casa prontas para agredir quem quer que seja, e numa rua movimentada qualquer
esbarrão é motivo para agressões.
Há bem um ano vi o homem
negro e cego na cidade de Porto Alegre, diminuí a velocidade do automóvel e o
observei caminhando em seu passo incerto, ostentando os cabelos quase todo
embranquecido.
Que seja feliz, e que sua
cegueira permita “ver” a humanidade pelo lado bom, pois se visse essa mesma
humanidade pelo lado ruim, jamais certamente gostaria de enxergar.
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