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terça-feira, 28 de abril de 2015

O Homem Negro e Cego.


Inicio dos anos 80 ia eu tranquilamente pela Rua Voluntários da Pátria, no centro de Porto Alegre, entre as Ruas Vigário José Inácio e Doutor Flores, ainda cedo, sete e pouco da manhã, quando em sentido contrário vinha um, na época jovem homem negro, com sua bengala tateando a calçada.

Já o conhecia, era um pobre homem cego que seguidamente, há muitos anos o via no centro da Capital.

Ele havia nascido cego e sem perspectiva vivia da caridade de um ou outro.


Quando o mesmo aproximava-se dei-lhe passagem entrando em uma porta recuada de uma loja, e ali fiquei a observá-lo em seu passo incerto.

Ao passar por mim uns dois ou três metros esbarrou em uma mulher que estava olhando a vitrine da loja.

Esta ao sentir-se encostada por um homem negro, estúpida e raivosamente, sem perceber que se tratava deficiente visual, desferiu um violento tapa em seu rosto.

Ao ser agredido, não sei como, ele conseguiu em um movimento rápido pegar a mulher pelo pescoço e com violência bateu duas ou três vezes com a cabeça dela na parede da loja.

Atônito fiquei a observar a agilidade do pobre homem cego, que em sofrer uma desmerecida agressão soube se defender.

Entretanto vi dois homens correrem na sua direção e enquanto o mais velho segurava o rapaz pelo braço direito o outo desferiu um forte soco, que o atingiu do lado do rosto.

O Povo que passava ao ver a briga afastou-se momento em que eu tinha que de alguma forma agir para evitar o espancamento do pobre homem cego.

Num pulo e aos gritos empurrei o homem mais velho, que desequilibrou e caiu na calçada, enquanto que o mais novo fez menção de me atingir, mesmo eu gritando que se tratava de um homem cego.

Na verdade os dois homens estavam  “cegos” de raiva do cego.

Quando o homem mais jovem desferiu um soco em minha direção, defendi-me com o braço esquerdo, surpreendendo-o com um movimento rápido imobilizando contra a parede.

Aos gritos dizia a ele que o homem negro era cego, momento em que o empurrei para o lado e abracei o cego protegendo com o meu corpo.

Os outros dois, aturdidos, pararam e somente aí entenderam o que eu dizia.

A mulher continuava estatelada ao chão com as pernas esticadas e as costas encostadas na parede.

Dois populares se acercaram para prestar-me auxilio momento em que dialoguei com os três agressores. O marido, a mulher e o pai dela.

Depois de uma conversa rápida e ríspida, cercados de populares, os dois mais desconfiados que gato em casa nova foram pedir desculpas ao cego.

Foram-se para o lado da Praça Rui Barbosa e eu mudei meu trajeto e levei o homem cego até as esquina da Avenida Borges de Medeiros com a Rua José Montauri.

Há pessoas que já saem de casa prontas para agredir quem quer que seja, e numa rua movimentada qualquer esbarrão é motivo para agressões.

Há bem um ano vi o homem negro e cego na cidade de Porto Alegre, diminuí a velocidade do automóvel e o observei caminhando em seu passo incerto, ostentando os cabelos quase todo embranquecido.

Que seja feliz, e que sua cegueira permita “ver” a humanidade pelo lado bom, pois se visse essa mesma humanidade pelo lado ruim, jamais certamente gostaria de enxergar.



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