Em meu livro sobre memórias
descrevo histórias curtas de várias famílias, vizinhos nossos em uma época em
que as coisas eram bem diferentes em um país extremamente atrasado e pobre.
Entre tantas histórias
transcrevo esta que muito marcou nossas vidas, pois foi um momento duro, triste
que gostaria que mãe alguma passasse.
Eu, meu irmão Joaquim e minha irmã
Ieda, o amigo Betinho e meu primo Dilson
Sedrez, ao fundo mamães grávida de
Lúcia.
Na segunda casa a esquerda
da nossa morava uma família de negros mui queridos pelos vizinhos. Era o casal
formado pelo Senhor Manoel funcionário civil do Exército e Dona Dalva.
Esse casal tinha vários
filhos, Teresinha de Jesus, a mais velha, João, Fó, Choca, Gibi, Chouriço e Bernadete.
Corria provavelmente o ano
de 1950.
Mamãe e Dona Dalva jamais
tiveram uma relação amistosa, já o contrário acontecia com o Senhor Manoel, um
excelente amigo, mas bota amigo nisto. Era muito requisitado pela vizinhança
devido aos seus conhecimentos de enfermeiro. Muitas e muitas vezes Seu Manoel
aplicava-nos injeções doloridas, mas que nos livravam de algum mal.
Seu Manoel, o primeiro, com
uma ripa de costela ao ombro
o terceiro, sem cobertura, meu
pai, o então Terceiro Sargento
Floribal Teixeira.
Papai o considerava muito,
pois quando sentou praça no Exército, Seu Manoel era Cabo enfermeiro, anos
depois Seu Manoel foi excluído do serviço ativo do Exército, porém voltou a
trabalhar no mesmo Regimento como funcionário civil, desempenhando a função de
cozinheiro, e no exército ficou até completar setenta anos quando foi
aposentado compulsoriamente. Lembrando que quando eu fui para o Exército, após
meu pai dele ter se aposentado, lá encontrei o velho amigo Manoel, que mais de
cinco anos após quando dei baixa do Exército ele lá continuou.
Explicada algumas coisas,
vamos aos fatos:
Teresinha
de Jesus, contava com 12 anos quando falecera, um trágico desenlace que abatera toda a vizinhança, pois era já uma mocinha, educada e prestativa.
Mas eu não tinha a noção do que era a morte, mas foi nesse momento que passei a conviver com essa presença doída na vida de todos.
Algum tempo depois Dona Dalva teve outra menina, a quem registrou com o nome da amada e falecida filha Teresinha de Jesus, pouco tempo depois esta filha contraíra uma grave doença, provavelmente tifo e a pobre menininha chegava a arrancar os próprios cabelos de tantas dores de cabeça, dores fortíssimas pelo corpo, vômitos constantes e altíssima febre. Os pais desesperados não tinham mais o que fazer para tentar salvar a vida da filha.
Mas eu não tinha a noção do que era a morte, mas foi nesse momento que passei a conviver com essa presença doída na vida de todos.
Algum tempo depois Dona Dalva teve outra menina, a quem registrou com o nome da amada e falecida filha Teresinha de Jesus, pouco tempo depois esta filha contraíra uma grave doença, provavelmente tifo e a pobre menininha chegava a arrancar os próprios cabelos de tantas dores de cabeça, dores fortíssimas pelo corpo, vômitos constantes e altíssima febre. Os pais desesperados não tinham mais o que fazer para tentar salvar a vida da filha.
Certo dia
minha mãe sabendo do estado deplorável que estava à menina e do desespero de
sua mãe, Dona Dalva, e vendo os filhos maiores, cujo mais velho deveria contar 10
anos também em desespero, caminhavam de um lado para outro ou mesmo sentados às
sombras das árvores chorando baixinho, resolveu, mesmo sabendo do ódio mortal
que essa Senhora por ela nutria, foi resoluta até sua casa e à porta bateu e
aguardou.
Ao abrir
a porta Dona Dalva ficou estupefata, pois ali estava minha mãe, a mulher que
ela tanto odiava, que num gesto humanitário, compadecida com a dor de outra mãe
que sofria tanto quanto a filha doente, um sofrimento que só sabe quem tem
filhos, e minha mãe já haviam perdido cinco, ainda em seus primeiros meses ou
dias de vida, pois era um país com altíssimas taxas de mortalidade infantil,
tinha ido a sua casa para ver Teresinha de Jesus, que passava por um estágio
gravíssimo da doença.
Mamãe
disse a dona Dalva o motivo que a levara até sua casa, e essa, comovida, com os
olhos marejados convidou mamãe a entrar e levou-a até o quarto onde estava
contorcendo-se em dores a menina Teresinha de Jesus, num sofrimento sem igual, que
dia e noite sofria com crises horríveis.
Ao chegar
ao lado da cama, vendo o lamentável estado da menininha, mamãe tirou-a da cama,
segurando-a firme em seu colo. A menininha parou de chorar e de contorcer-se e
envolveu com seus bracinhos esquálidos o pescoço de mamãe, e uma calma
estabeleceu-se naquele momento de tanta dor e desespero. Uma calma tão grande
que a todos fez silenciar, e com lágrimas nos olhos dona Dalva assistia aquele
momento comovente.
Mamãe
caminhou alguns passos em direção a uma janela com a menininha no colo, que
subitamente apresentava-se calma, parecendo estar curada das dores que lhe
consumiam as forças e abraçada a mamãe a menininha deixou de sofrer, dando um
último sorriso, falecendo em seus braços. Braços ternos da pessoa que tanto sua
mãe odiava.
Dona
Dalva num momento de dor, entre lágrimas abraçou minha mãe e por um breve
momento aquelas duas mulheres que tanto se odiavam tiveram uma nesga de
compreensão e carinho uma pela outra.
Mamãe,
com lágrimas nos olhos, entregando a menininha morta aos braços de Dona Dalva,
disse:
- Agora
ela está em paz.
Tristeza
muito grande abateu-se na vizinhança, muitas lamentações, choros comovidos e
doídos, romaria à casa pobre de seu Manoel.
Passou-se
algum tempo e lá estava dona Dalva novamente grávida.
Meses
depois ela teve outra menina, e resolveu homenagear as filhas falecidas dando-lhe
o mesmo nome, Teresinha de Jesus.
Antes de
completar um ano de vida, a nova Teresinha de Jesus, adoeceu e começou com os
mesmos sintomas da irmã falecida, novamente o desespero abateu-se sobre aquele
casal, que associando a doença ao nome, resolveu então chamá-la de Dalvinha, em
referência a sua mãe, Dalva.
Por
ironia do destino algumas semanas após terem trocado o nome da menina, por conselho de amigos, no seio
familiar a mesma começou a apresentar melhoras e com o tempo ficou curada, mas,
por prevenção continuou a ser chamada de Dalvinha para sempre.
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