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segunda-feira, 10 de março de 2014

Burro Tenente





O que transcrevo abaixo é mais uma história encontrada em meu livro de Memórias, sobre o meu velho pai Floribal Farias Teixeira, quando ele era ainda um menino de dezesseis anos e morava em uma pobre casa no Fragata, em Pelotas.



Ele sempre contava esta história e dizia que a raiva havia passado, pois como vaticinara o engraxate a sua vida mudara da extrema miséria a uma vida de segurança e fartura.


Certa feita, o jovem enamorado, que contava com seus dezesseis anos, fez uma aposta no jogo do bicho e acertou o milhar na cabeça. Não havia jogado muito, mas deu para pagar umas contas, dar um bom dinheiro para sua mãe e ainda mandar confeccionar um terno de casimira inglesa, e comprar um belo chapéu, sapatos, camisa e gravata, e num domingo todo faceiro foi passear na Praça Coronel Pedro Osório, sorridente e garboso.

No corredor da praça que sai em diagonal ao Mercado Público, em frente a Prefeitura havia uma banca de engraxates. Ali o jovem, ainda um menino parou para engraxar os sapatos empoeirados.

Sentou-se em uma das cadeiras e enquanto um engraxate fazia o serviço de escovação e graxa em seus sapatos, o irmão desse, também  engraxate, caminhava de um lado para outro e recitava um versinho a cada vez que passava perto do jovenzinho Floribal que sem se dar conta do que acontecia ao redor, admirava os prédios belíssimos que compõem o mais precioso conjunto arquitetônico da cidade, Prefeitura, Biblioteca e Mercado Público, Banco do Brasil e Grande Hotel em frente daquele canto da praça.

            E assim recitava o verso o tal engraxate:



            - “Burro tenente!”.

              “Carrega a carga e não sente!”.



            E várias vezes repetia a mesma cantoria:



 - “Burro tenente!”.

               “Carrega a carga e não sente!”.



     O jovem não entendia porque o engraxate fazia insistentemente aquele versinho rindo maliciosamente.

Após ter terminado o serviço o jovem pagou ao engraxate e foi-se garboso Praça a fora com seu lindo terno e seu vistoso chapéu.

Após ter passeado pela Praça Coronel Pedro Osório e pelo centro da cidade, foi até a Rua Floriano Peixoto para pegar uma condução para o Fragata, instante em que no ponto de bondes foi dar uma ajeitada nos cabelos, tirou o chapéu, momento em que varias bolinhas de papel caíram de sua aba.

Constrangido e envergonhado, vermelho como um pimentão maduro, tapado de nojo o jovem até pensou em voltar à banca de engraxates para tomar satisfação ao fazedor de versinhos. Mas ao contrário, levado por essa vergonha foi-se embora.



Vinte e dois anos depois voltaria a essa mesma banca de engraxates que ainda funcionava com os mesmos irmãos, já velhos que continuavam a engraxar sapatos, só que agora sim, como vaticinara em seus versinhos o engraxate, um garboso Tenente do Exército, em seu belo uniforme verde oliva, com as belas estrelas sobre os ombros, mas nada disse, pois viram os irmãos ao longo dos anos multiplicarem-se as divisas, quando por ali seguidamente passava, e depois o losangos dourados, um em cada ombro como Subtenente e finalmente brilhar as estrelas azuis de pontas prateadas do “Burro Tenente”.



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