Após 56 anos resolvi tirar
do total silêncio uma das experiências mais bizarras e chocantes de minha, na época, incipiente vida.
Meu avozinho paterno, não sei
por que cargas d’água convidou meu pai, um na época subtenente do Exército, para levar-nos a um tal de culto em um templo cristão não
católico, e meu pai que não era quera (cuéra) de andar envolvido com esses
farranchos, pois raríssimas vezes foi a uma Igreja católica, aceitou tal
convite e em uma noite fomos nós pela Rua Tiradentes acima para tal
tabernáculo.
Papai e mamãe a frente com
as duas filhas e eu e meu irmão atrás, os dois de traje cinza claro, e lá fomos
nós.
Góim! Góim! Góim! Góim!
Esses “góim”, em nossa
sonoplastia quando brincávamos significava o barulho de passos apressados
quando góingóingóingóim ou mais lentos quando fossem góim - góim
- góim - góim.
Entramos em tal, melancólico
e escuro recinto, onde as pessoas nos olhavam com olhares de pena,
desaprovadores, perplexos, apavorantes e muitos em seus rostos parvos mostravam
expressões de total alienação, distantes do mundo real.
Simplórios.
As crianças lá presentes me
pareciam apavoradas, sestrosa, triste, irreais. Cheias de medos.
Foi um festival, onde muitas
vezes olhava para meu irmão e fazia um esforço terrível para não rir, pois tudo
o que o líder daquele rebanho demenciado dizia não fazia sentido, eram palavras
desconexas e muitas, na maioria se quer eu entendia, pois o tal sujeito era
americano, e desafortunadamente, já que nos colocaram na primeira renque de
bancos, em pé, tive a infelicidade dele ficar em minha frente o tempo todo, tão
perto que podia sentir o cheiro nauseante de suas roupas.
Foi uma experiência tão
nefasta que saímos de tal local, calados e assim chegamos a nossa casa que
ficava na Rua Álvaro Chaves 413, em total silêncio, mesmo meus pais.
Nenhum jamais tocou no
assunto.
Essa experiência jamais foi
comentada, não só no seio familiar, como foi sem nenhum acordo esquecida, e
papai jamais teve a ideia de nos carregar para um lugar como aquele.
Que bom.
Um lugar triste e
apavorante. Um lugar onde o pavor era imposto e as entidades satânicas
inexistentes eram alardeadas como se fosse os pilares daquela seita atrasada,
doente e demente.
E o pior é que eles acreditavam
naquelas sandices.
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