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terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Houve Um Tempo

       
         Transcrevo abaixo um trecho de meu livro sobre minhas memórias.

             
                   





O tempo passou como um carro sem freios ladeira abaixo, e já mocinho, com seis ou sete meses, estava no colo de meu saudoso pai, já que comecei a caminhar antes dos dez meses de vida. Olhava fixamente para os seus grandes e alvos dentes e a seu inconfundível bigode preto e bem aparado, quando ele se aproximou da porta da sala de jantar, que saía para o pátio lateral conhecido mais tarde pelos meus irmãos e por mim como o lado, e apontando com a mão direita mostrou-me algo, dizendo:

- Olhe!


- A Lua!

Impressionante.


Era uma visão espetacular. Lua Cheia, noite límpida. Aquele clarão mais me encantava do que me dava medo.


Era uma visão fantástica!


Fiquei estarrecido, meu coração disparou e meu mundo não era somente a casa, agora, além da porta eu podia ver aquilo tão belo que ele chamava de Lua.


De relancina, meu irmão Joaquim Luís, que naqueles idos de 1946 já era “homem feito”, com três anos passou correndo e pulando porta a fora e com ele minha irmã mais velha, Ieda de Lourdes, já “adulta” com quase sete aninhos. Corriam, pulavam, gritavam e passavam por entre as cercas vivas que separavam o nosso pátio do velho Corredor das Bochas, uma servidão de passagem que permitia o acesso à cinco casinhas e também servia de entrada à chácara do velho senhor e amigo Ricardo Stein e Dona Suzana Klomp Stein, quais nomes somente muito tempo depois passei a saber.

Lua!


A Lua!

Era um tempo mágico e eu começava a fazer parte daquela magia.

Um mundo mágico sob o clarão da Lua.


Lembro-me claramente de minha mãe dizer:


- Não o leves para rua! Tem sereno!


O que é sereno?

Olhei em volta para ver o que era o tal de sereno. Mas a coisa que mais me chamava à atenção era aquela brilhante Lua, despojada sorrindo para mim.

Encantado.

Seduzido.

Era a coisa mais linda e mágica que já havia visto até então e naqueles poucos minutos em que estivemos junto a porta, olhando aquela maravilhosa Lua, tão grande, tão brilhante que insistia em me manter a ela preso, como se nada mais existisse naquele céu, imensa campânula de cristal negro, pontilhado de pequenas luzes que eu não fazia a menor ideia do que eram. 

Eu e a Lua!


A Lua e eu!


A inocência e a beleza!

O puro encantado pelo extremamente belo, atraente e mágico, que me hipnotizava, que me encantava.


Vi mamãe aproximar-se delicada, sutil, pisando macio como um lince, como se flutuasse e silenciosa abraçou-se a papai, com tanto amor, um amor que extravasava, pois todos sabiam o quanto se amavam e a ele, parecendo ser extremamente submissa, encostou sua cabeça em seu ombro e ali ficou também contemplando aquela mágica Lua.


A Lua tão radiante e mágica, iluminava aquele casal e seus, até então, três filhos que eram tão felizes, felizes dentro daquela ingenuidade pueril que um dia o tempo e as adversidades apagaram, mas não consegui apagar de nossas lembranças aquela união tão alegre, pura e romântica, que numa noite, sob o clarão irradiado por aquela mágica Lua fazia ser nossa convivência tão harmoniosa quanto feliz.


Uma felicidade que o tempo levou.


Uma felicidade que mesmo tão distante faz, invariavelmente meu olhos marejarem de tanta saudade.

Saudade imorredoura.




                      
     

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