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domingo, 9 de agosto de 2015

Parada do Orgulho Hétero


Assistindo na televisão um noticiário, vi a Parada o Orgulho Gay, junto comigo estavam minha mulher e minha filha.

Na hora, quase que uníssonos, dissemos que deveríamos organizar uma Parada semelhante.

E de imediato minha filha sugeriu um nome, Primeira Parada Canoense do Orgulho Hétero.

- Boa ideia.

Seria bonito andarmos pelas ruas, com carro de som, os filhos, amigos e parentes com suas respectivas esposas, noivas e namoradas. Seus filhos e netos numa grande e festiva caminhada enaltecendo o orgulho Heterossexual. Afinal somos fruto disto.

Lindo. Porém sem purpurina, nem lantejoulas.

- É isto aí – Disse quando soube o meu filho – Eu e minha mulher apoiamos e vamos ajudar a organizar.

O outro filho quando soube já disse:

- Pai eu tenho um grande caminhão e sobre ele podemos botar a Bandinha do Fritz, que é nosso amigo e festeiro.


- Boa ideia, a Bandinha do Fritz é sensacional.

Telefonemas e conversas aos Pés de Ovídio.

Opa! Desculpem! Esta frase foi corrompida com o tempo e como muitas outras mudou e tornou-se "ao pé do ouvido", e juntamos mais de quinhentos nomes.

Minha filha então, como é muito organizada resolveu e lançou tudo no computador. Duas semanas depois ela me mostrou a enorme lista de nomes, eram mais de mil.

E isto que fizemos só na base da conversa, sem imprensa, sem estardalhaços. Apenas na base da amizade.

Tudo organizado.

Falta agora marcar a data.

Minha mulher muito atilada sugeriu que deveríamos fazer em um dia que marcasse bem. E após considerar os prós e contras vimos que seria o melhor dia para a Primeira Parada Canoense do Orgulho HETERO, na tarde do dia de São João.

Êba! Êba!

Reunimos imediatamente com três comissões já organizadas e partimos para os finalmentes.

Uma das Comissões sugeriu que a concentração fosse feita na Pracinha, local central e de fácil acesso.

Ao meio dia da tarde marcada já estava no local o Caminhão do som, já com a Bandinha do Fritz fazendo o maior estardalhaço. E dê-lhe polca.

Subi com relativa facilidade no enorme caminhão e juntamente com meus filhos fomos testar o equipamento de som, e foi aquele sonzão.

Já estava a praça sendo tomada por uma multidão, e todos vestidos normalmente, pois a comissão de adereços achou que como a Parada do Orgulho Gay é coloridas, cheios de plumas e paetês, nós da Primeira Parada Canoense do Orgulho HéTERO, deveríamos ser discretos no vestir.

Estava a coisa mais linda. Os homens vestidos a caráter com suas esposas e filhos sem muitos apelos chamativos. Alguns até com trajes dos anos 20.

Mas também vi gente de calça de brim e camiseta regata, outros todos de preto e quase todos com faixas enroladas e cartazes.

O Presidente da Comissão de Divulgação, que pouco fizera, pois tudo havia corrido ao natural, pediu então que o pessoal fosse desenrolando as faixas e cartazes diante do caminhão que era para que as comissões e o grupo Organizador vissem o que sairia junto para dar o nosso recado do Orgulho Hétero.

As primeiras a mostrarem suas faixas foram duas colegas de uma de minhas noras
.
“A baixo a pouco vergonha de mulher ficar com mulher”

E veio outra faixa.

“Pena de morte aos que defendem o casamento gay”

E mais e mais foram sendo mostradas:

“Um gay morto é menos um gay no Mundo”

“Casamento gay é a vergonha para todos”

“Deus odeia Gays”

“A família homem e mulher é coisa divina”

“Os gays irão para o inferno”

Meus filhos, minha filha, minhas noras, meu neto, minha mulher e eu ficamos atônitos e o pessoal das Comissões também.

E todos embasbacados se entreolharam.

Mas de súbito peguei o microfone e comecei a falar:

- Pessoal! Vocês entenderam mal o motivo deste evento. Ele foi organizado para ser a Primeira Parada Canoense do Orgulho Hetero e não para ser um estopim de ódio e discriminação.

- Nós, meus amigos, estamos aqui para dizer que somos heterossexuais, porém não temos ódio de homossexuais. Nos somos civilizados. E muitos que acreditam e falam em deus trazem inclusive faixa com a palavra deus escrita, cheias de preconceitos e ódio.

- É isto que vocês acham que é o deus de vocês. Recriminador, discriminador, odioso, violento, desamoroso, fascistóide, mau, insensível, sórdido, rancoroso, preconceituoso.

- Não!


- Minha família quando pensou nessa Parada foi para dar outro recado.

- O da tolerância.

- Do amor.

- Da compreensão.

- Do carinho.

- Da civilidade.

- Da Igualdade.

- Da dignidade.

- Não precisamos ser violentos, odiosos, para sermos héteros, isto deixamos para os trogloditas, arruaceiros, assassinos e outros bandidos.

- Temos orgulho de sermos héteros porém não odiamos ninguém, não recriminamos, não discriminamos. Pois todos são iguais. Todos são humanos.

- Se eles vivem com amor, é problema deles. Porém marido que agride, desfigura, assassina a própria mulher é sim problema nosso.

- Quantos casais héteros vivem brigando, se agredindo, num desamor de fazer chorar.

- Para ser hétero não precisa ser um animal irracional.


E conforme falava o povo ia jogando em um grande terreno baldio as faixas e cartazes e iam para as suas casas em silêncio e em minutos poucos restavam na praça.

Minha família e uma dúzia de amigos.

No terreno baldio ficou aquela montanha de paus e panos, foi quando o Fritz disse:

- Seu Pedrrro! Seu Pedrrro. Eu fica faiz pensando e tive um ideia meio maluco.


- Em feiz do xente ir emborra para cassa, ver televisón e ainda ter que lavar o louça para a frau Guerda, nóis famos organizei um fogueirrón de São Choão com esse montón de lixo que sobrei do nosso falido Parrrada...

- Oh Nêne! Como é mesmo que se diiz. Hetéro, Heteró. Eu não sabe falei esses palavrra difícil.

E a noite sob o brilho das estrelas, minha família e nossos amigos civilizados, mais a Bandinha do Fritz fizemos uma bela noite de São João, onde não faltou amizade, compreensão, carinho, humanidade, fraternidade, civilidade, urbanismo, e ninguém, mas ninguém mesmo estava com ódio, arrogância, discriminação, violência ou qualquer outro tipo de maldade no coração. Brincamos e nos divertimos sem ódios.

E no frigir dos ovos queimamos todas aquelas porcarias feitas com tanto ódio.



- Olha Seu Pedrrro, até uma parril di chopps a xente conseguiu parra a nosso festón de São Choão.


Que bom se o mundo fosse verdadeiramente humano, mas ele só é humano na ficção.  

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