Corria o ano de 1947, papai
para dar um divertimento aos filhos que quase nada tinham para brincar, não
havia games, computador, celular, nada que essa gurizada já nasce usando e
vivem reclamando, fez com uma velha corda um balanço na porta de um grande
galpão aos fundos da pobre casa. Quase todas eram de pobres a miseráveis a não
ser de uma pequena, abastada, fleumática e burra burguesia que moravam em
palacetes e casarões na cidade de Pelotas.
Para passar o tempo muitas
vezes ficávamos à janela da sala olhando o bucólico movimento da rua. Cachorros,
cavalos e vacas, que lerdas pastavam do outro lado da cerca em enorme campo
que se estendia da frente de nossa casa até o Parque Sousa Soares e nenhuma
construção havia naquele imenso espaço vazio.
Durante a semana passava em
frente a nossa casa uma ou duas fubicas que serviam para que fizéssemos enorme
algazarra ao ver aquelas geringonças rodando rua a fora.
Joaquim e Ieda
O balanço passou a ser a
brincadeira de Ieda e Joaquim, já adultos feitos, ela com 8 anos e ele com 4
aninhos, eu não havia completado ainda dois anos.
Brincavam, riam, se
divertiam.
Nesse galpão havia dois
tanques. Um pequeno onde mamãe eventualmente lavava roupas, pois geralmente ela
fazia em uma tina que havia no meio do pátio e outro tanque grande onde ela
reservava água para algumas necessidades, já que o abastecimento era precário.
No pátio interno da casa
havia um terceiro tanque, que sempre bem limpo e bem coberto servia em último
caso para beber, fora enorme barril que mamãe mantinha na cozinha, sempre com água
fresca, não só para beber como para cozinhar.
Deste galpão, por uma porta
interna se entrava na latrina. Latrina essa equipada com o que havia de mais
moderno, pois no lugar do profundo buraco fétido e cheio de excrementos humanos
o que tínhamos era o que toda a vizinhança tinha, o valoroso cabungo. (leia
Cabungueiros e seus cabungos, publicado neste blogue em 03 de março de 2012).
Certa feita meus irmão
resolveram me colocar naquele tosco balanço, sem nenhuma segurança.
E conforme Ieda e Joaquim
revezavam-se a me empurrar, mais alto ia e quanto mais alto mais assombrado eu
ficava.
Num determinado momento Ieda
empurrou-me com tanta força que meus pezinhos quase tocaram as folhas de zinco
ondulado que cobriam aquele velho galpão. Neste momento meus bracinhos não
suportando mais o peso de meu esquálido corpo fez com que minhas mãos soltassem
a corda e num instante despenquei dentro daquele enorme tanque, afundando
imediatamente.
Nada mais me lembro deste
fatídico dia, pois no momento em que mergulhei nas águas frias e para mim,
profundas daquele enorme tanque, as coisas se apagaram e tudo mais sei de ouvir
minha mãe contar.
Sem saber o que fazer Ieda e
Joaquim, apavorados correram para dentro de casa e se esconderam em um dos
quartos.
Mamãe que estava na cozinha,
como sempre cozinhando, fazia ela a janta, ao ver os dois correndo miudinho e
apavorados para dentro de casa, no seu 6º, 7º, 8º, milésimo sentido percebeu
que algo de errado estava acontecendo, e como uma flecha correu para o galpão
escuro, já que o Sol estava se pondo.
Sabia ela que eu estava com
eles brincando e não me encontrando, sua fera interior aflorou e ela como uma
gata correu para o taque e nele literalmente mergulhou, ali me encontrou
submerso já quase me afogado.
Por um de meus pés levantou-me
para fora d’água e no desespero começou a bater firme e forte em minhas costas,
mantendo-me meio de cabeça para baixo.
Neste instante, já quase no
derradeiro instante eu abri o tarro e comecei a chorar.
Minha amada (sorrateiras
lágrimas)
mãe!
Pela segunda vez me deste a vida.
(mais
lágrimas sorrateiras).
Minha heroína amada. Minha
salvadora.
No mesmo instante, inteirado
do ocorrido, noite já escura como breu, papai, que havia a pouco chegado do Quartel, num repente foi até o velho galpão e retirou o balanço e nunca mais tivemos onde nos
balançar.
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